O antigo chefe de Estado, um dos protagonistas do período da transição espanhola da ditadura para a democracia, após a morte do ditador Francisco Franco, em 1975, abdicou em 2014 e vive fora do país desde 2020, na sequência de escândalos de corrupção e comportamentos considerados desrespeitosos das instituições nacionais.
Desde então, a presença de Juan Carlos I em Espanha tem ocorrido sempre a título privado, sem qualquer reconhecimento institucional, e com a Presidência do Governo, os dois grandes partidos espanhóis (socialistas e populares) e a própria Casa Real, agora liderada por Felipe VI, a evitarem declarações sobre o rei emérito.
Apesar de o antigo monarca de 87 anos ter visto serem entretanto encerradas as investigações judiciais de que era alvo, as revelações sobre a origem duvidosa da sua fortuna minaram a imagem de uma personalidade que durante décadas foi muito respeitada e de grande popularidade, atendendo ao papel que se lhe reconhece durante a transição democrática.
A possibilidade de estar presente nas celebrações previstas para este ano tornou-se assim numa incógnita e num das grandes curiosidades suscitadas pela imprensa nos últimos dias.
Questionado sobre essa possibilidade de forma insistente numa conferência de imprensa na terça-feira, o ministro da Memória Histórica, Ángel Victor Torres, acabou por admitir a presença de Juan Carlos I em atos institucionais em Espanha em 2025 dentro das celebrações dos 50 anos da democracia, embora sem nunca referir diretamente o antigo monarca e remetendo a decisão para a Casa Real.
"O gabinete da Presidência do Governo está em contacto permanente com a Casa Real. (...) Aquilo que fizermos será acordado", respondeu.
Ángel Victor Torres sublinhou que "o papel da Casa Real foi fundamental" nos "primeiros anos" da transição para a democracia, considerando que "por sorte" houve uma "aposta clara pela monarquia constitucional" e não ficou "tudo atado e bem atado" como pretendia o ditador Francisco Franco, por vontade de quem Juan Carlos I herdou todos os seus poderes em 1975.
Do programa hoje divulgado, com mais de uma centena de iniciativas até dezembro, consta um evento, previsto para 22 de novembro, com o título "A monarquia e a democracia", sem que haja mais detalhes.
Segundo o Governo espanhol, o Rei Felipe VI liderará ainda delegações que visitarão os antigos campos de concentração nazis de Auschwitz e Mauthausen, em que morreram exilados espanhóis.
As celebrações da "Espanha em Liberdade" arrancaram hoje, com uma cerimónia no Museu Nacional de Arte Contemporânea Rainha Sofia, em Madrid.
Foi a primeira de uma centena de iniciativas com que o Governo espanhol pretende, ao longo de 2025, celebrar os 50 anos da "Espanha em Liberdade", usando como pretexto a morte do general e ditador Francisco Franco, em novembro de 1975.
Estas celebrações foram anunciadas no mês passado pelo primeiro-ministro, o socialista Pedro Sánchez, e a escolha da morte de Franco como pretexto gerou críticas por parte de diversos setores, com os partidos de direita nacionais à cabeça.
O Partido Popular (PP, a maior força política no parlamento) demarcou-se das celebrações e acusou Sánchez de "desenterrar Franco" num momento de "desespero e decadência" da governação e de "agir como nostálgico do confronto entre espanhóis".
O PP questionou que o pretexto para celebrar a democracia seja a morte do ditador, dando-lhe protagonismo, e não as primeiras eleições, em 1977, ou a aprovação da Constituição de 1978, que instituiu o regime atual e é já assinalada em Espanha com um feriado nacional.
"Todos os países próximos comemoraram o aniversário das suas democracias e usando o mesmo marco, o início do fim das suas ditaduras, o início do processo democratizador", disse hoje Pedro Sánchez, repetindo o argumento que o Governo tem usado nas últimas semanas, com referências a casos como o de Portugal, em que se celebra a revolução do 25 de abril de 1974, mesmo que a democracia em Portugal não tenha ficado assegurada nesse dia.
O debate aberto nas últimas semanas voltou a tornar pública a divisão que existe no país em relação à memória história do século XX, nomeadamente, a guerra civil (1936-1939), a ditadura franquista que se seguiu e a designada transição para a democracia.
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