Na terça-feira, foi publicado o relatório intercalar da recuperação de processos pendentes na Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), que estima em 1,6 milhões o número de estrangeiros residentes em Portugal em 2024, muito acima dos anteriores dados estatísticos.
Este aumento do número de estrangeiros, que correspondem agora a 16% da população nacional, constitui um desafio, "não para o Governo nem para o Estado, mas para o país", afirmou à Lusa Pedro Góis.
O relatório referente a 2023 apontava para pouco mais de um milhão de estrangeiros em Portugal, mas os dados agora divulgados fazem correções estatísticas aos anos anteriores, tendo em conta a regularização dos processo de manifestação de interesse, um recurso jurídico, entretanto extinto, que permitia a normalização de quem chegasse com visto de turismo.
"Agora que conhecemos melhor uma realidade que já preexistia", é necessário "reconstruir as políticas nacionais de acolhimento de imigrantes, de integração e até das estruturas que com eles lidam, porque estamos a falar de um número que ultrapassa e muito aquilo que estava planificado", afirmou o investigador da Universidade de Coimbra.
Para Pedro Góis, "é necessário repensar as estruturas e produzir políticas que se adequem à realidade real e não à realidade que estava imaginada".
"Não podemos integrar comunidades que desconhecemos" e quem está hoje a chegar a Portugal é muito diferente do que cá existia.
No futuro, o "país necessitará de reconstruir os serviços públicos para lidar com uma população que agora é 16% estrangeira", mas que, em algumas zonas do país, será ainda superior, com valores na ordem dos 30%.
"Os serviços públicos têm de se adaptar", apostando na digitalização dos serviços, pelo que "há aqui uma oportunidade que é de reformarmos o Estado no acesso dos cidadãos, aproveitando a chegada de tanta gente", explicou Pedro Góis.
No futuro, será preciso "mais acesso à escola, mais habitação, mais Serviço Nacional de Saúde e isto tudo tem que ser preparado com o poder local, tendo em conta a população que aí existe", alertou o investigador.
"Se há algumas décadas fechámos escolas, se há algumas décadas fechámos serviços públicos um pouco por todo o interior despovoado do país, temos agora de repensar se não necessitaremos de reabrir esses serviços e de readequar a oferta àquilo que são as necessidades da população à oferta".
Este trabalho não pode ser feito "de um dia para o outro", mas corresponde a um processo que a sociedade terá de "encarar de frente, correndo o risco de este rejuvenescimento demográfico (...) fugir para outros países que lhes ofereçam melhores condições".
A curto prazo, o país terá de promover processos de reagrupamento familiar, "um direito humano essencial", para acelerar a integração dos estrangeiros, mas Pedro Góis alerta para a necessidade de condições prévias.
"O Estado português tem de assegurar que as pessoas que cá estão têm condições de cumprir também o regulamento de reagrupamento familiar, designadamente em termos de habitação e em termos de rendimentos auferidos", exigências da legislação nacional, avisou.
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