Uma equipa de investigadores avaliou o impacto da política responsável por reservar 2% de vagas no ensino superior público para os mais carenciados e concluiu que em 2023 apenas 43% dos alunos elegíveis (escalão A do Apoio Social Escolar) concorreu através do novo contingente.
O estudo mostra ainda que quase metade dos colocados (41%) não teria ficado no curso que escolheu se não tivesse ativado este apoio, salienta Pedro Luís Silva, coordenador do estudo divulgado hoje pelo Edulog, da Fundação Belmiro de Azevedo.
Entre os que se candidataram através do contingente especial, 93% conseguiram vaga, uma percentagem que desce para 78% quando se analisa os restantes candidatos elegíveis que não usaram a nova benesse.
O estudo mostra que o programa funciona, mas "lança um aparente quebra-cabeças. Porque é que os alunos não usaram o contingente?", questionou Pedro Luís Silva.
Os investigadores encontraram três possíveis obstáculos: desconhecimento sobre o novo programa, restrições financeiras das famílias e desajustamento entre a oferta de programas no ensino superior e os interesses dos estudantes.
Os mais pobres têm "grandes dificuldades em deslocar-se porque há um grande aumento nas despesas e as bolsas de estudo são relativamente modestas", lembrou Alberto Amaral, membro do Conselho Consultivo do Edulog, defendendo um reforço dos apoios sociais.
Existem muito mais estudantes carenciados a permanecer no mesmo distrito quando transitam para o ensino superior quando comparados com os que têm mais rendimentos, sendo que "em alguns distritos, a percentagem é três a seis vezes superior", lê-se no estudo que mostra que este é um problema que se sente mais entre os alunos de Portalegre, Guarda, Bragança, Viana do Castelo, Leiria e Santarém.
Os elevados custos do alojamento continuam a ser um dos principais motivos que impedem de estudar longe de casa: Os quartos estão cada vez mais caros e em muitos casos os alunos não conseguem que o senhorio passe o recibo exigido para ter apoio estatal, lembrou Alberto Amaral.
A ideia é corroborada por Pedro Luis Silva que lembra que a existência de um contingente "por si só, não faz com que os alunos passem a candidatar a programas seletivos", defendendo um reforço das ajudas financeiras, nomeadamente para despesas de deslocação e alojamento.
Outra das possíveis razões para muitos alunos não terem usado o contingente pode ser o desconhecimento do programa e, por isso, o Edulog recomenda que haja mais divulgação, com vídeos tutoriais para professores e estudantes e "informações mais claras no site da Direção-Geral do Ensino Superior".
As famílias e alunos da região da Grande Lisboa foram as que menos recorreram ao contingente prioritário, contrastando com as regiões autónomas, onde houve uma participação notavelmente mais elevada.
Para Alberto Amaral, este facto poderá estar relacionado com a maior familiaridade na utilização de contingentes prioritários, uma vez que as escolas das ilhas estão mais habituadas a usar os diferentes contingentes que existem.
A publicação das notas mínimas de entrada para todos os contingentes é outra das propostas dos investigadores.
"Seria muito importante publicar as notas mínimas de entrada não apenas do regime geral de acesso, mas também deste contingente prioritário e de outros. Se calhar os alunos não se candidatam a determinado curso, porque podem pensar que não conseguem entrar em determinado curso, mas com a nota do contingente do ano anterior isso poderia criar um incentivo", defendeu o especialista.
O coordenador lembrou ainda que o atual estudo se focou na questão do acesso, mas que será preciso também avaliar o impacto da medida no futuro destes jovens, nomeadamente no ensino superior e no mercado de trabalho.
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