Enquanto surgem críticas da comunidade internacional aos planos do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para Gaza anunciados na terça-feira, o Governo português mostra-se reticente na tomada de um condenação "inequívoca".
Durante o debate quinzenal desta quarta-feira, o primeiro-ministro, Luís Montenegro foi questionado acerca do assunto, já depois de o ministro da Defesa, antes do debate, ter dito que "não lhe compete comentar" a política interna norte-americana", acrescentando que estavam em causa "singularidades" da mesma política, "que, por estes dias vai sendo, a esse propósito, muito rica e animando noticiários".
No debate, entre apelos e pedidos de clarificações de vários partidos, como o Bloco de Esquerda, Partido Comunista e Livre, o chefe de Governo começou por dizer, quando confrontado pelo assunto pela líder dos bloquistas, Mariana Mortágua: "Todos os países têm singularidades na sua política interna. É uma evidência. Nós também temos as nossas. Quanto à questão de fundo, a posição do Governo português foi sempre muito clara: preconizamos uma solução que possa fazer conviver, em paz, em direito pelo respeito internacional, humanitário, dois Estados - o de Israel e o do Palestina. Estaremos sempre desse lado".
As questões surgem no dia seguinte às declarações polémicas de Trump, que disse que os EUA "iam tomar controlo" de Gaza e criar empregos, ao mesmo tempo que defendeu que os palestinianos fossem "felizes" noutro sítio que não aquele território, sugerindo que países como o Egito ou a Jordânia os acolhessem - algo que estes já tinham dito que não iam fazer.
Também ontem, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, disse que o reconhecimento do Estado da Palestina por Portugal "acontecerá, no momento certo", defendendo que israelitas e palestinianos devem cumprir o cessar-fogo e trabalhar "com espírito construtivo" para os dois Estados.
Mais tarde, esta quarta-feira - e depois de ouvir o apelo comunista para que reconhecesse o Estado da Palestina -, Montenegro voltou a ser questionado sobre o assunto pela líder parlamentar do Livre, Isabel Mendes Lopes. "Isto não é o presidente dos Estados Unidos a brincar aos agentes imobiliários, isto é uma violação clara do direito internacional e dos direitos humanos", considerou a deputada, questionando o Executivo se iria condenar as declarações de Trump.
Repetindo o que já tinha respondido a Mortágua, Montenegro ripostou: "Todas as declarações que desrespeitem estes princípios, nomeadamente as que possam antecipar qualquer tipo de limpeza étnica ou atitude semelhante têm a nossa condenação. Não sei qual é a sua insistência. Quer que diga uma determinada coisa? Eu já disse o que queria dizer."
Em resposta, a líder parlamentar do Livre considerou que "ficou claro que [o Governo] não condenada inequivocamente as declarações de Trump" e olhou para o futuro: "Imagine que um dia Donald Trump decide que quer anexar os Açores e fazer uma 'riviera' no meio do Atlântico?"
Perante a insistência, e com 'tudo o que o Governo queria dizer', Montenegro garantiu que o caminho de Portugal era o do diálogo e também "muito apreciado nas instâncias internacionais muitas vezes pela sua capacidade aproximar posições".
Mas se não houve uma condenação "inequívoca", Montenegro não deixou espaço para dúvidas, dizendo que "os Estados Unidos são inequivocamente nossos aliados". E avisou o Livre: "Senhora deputada, não vai contar com o Governo de Portugal para inquinar a nossa política externa com alguma dúvida que possa ser suscitada por qualquer declaração que extravase o nosso objetivo e responsabilidade de, no contexto internacional, estarmos na linha da frente do direito internacional e humanitário e também de estarmos a salvaguardar o interesse de Portugal".
Ainda hoje, Trump disse que "toda a gente adora" a sua proposta para Gaza, anunciada ontem após um encontro o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, em Washington DC.
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