O Tribunal Constitucional (TC) chumbou a proposta para um referendo sobre o Alojamento Local (AL) em Lisboa e invocou a falta de verificação da legalidade da iniciativa popular por ausência de "um controlo efetivo das assinaturas" necessárias.
Em causa está a iniciativa popular promovida pelo Movimento Referendo pela Habitação (MRH), que propõe duas perguntas: Concorda em alterar o Regulamento Municipal do Alojamento Local no sentido de a Câmara Municipal de Lisboa, no prazo de 180 dias, ordenar o cancelamento dos alojamentos locais registados em imóveis destinados a habitação? Concorda em alterar o Regulamento Municipal do Alojamento Local para que deixem de ser permitidos alojamentos locais em imóveis destinados a habitação?
As explicações do Tribunal Constitucional
Para ser considerada, a iniciativa popular deve ser proposta à assembleia deliberativa por um mínimo de 5.000 ou 8% dos cidadãos eleitores recenseados na respetiva área, consoante o que for menor.
Três dias depois da deliberação quanto à realização do referendo local, o movimento entregou à Área Metropolitana de Lisboa (AML) um segundo lote de assinaturas, com mais 612 cidadãos eleitores recenseados no município de Lisboa, que seguiram para o Tribunal Constitucional sem verificação prévia.
Apesar de considerar que o processo apresentado pela presidente da AML se mostra "regularmente instruído", o Tribunal Constitucional considerou que a recolha das assinaturas necessárias e a sua verificação é "uma formalidade essencial, cuja inobservância compromete a própria existência de uma iniciativa popular válida, dando origem a uma ilegalidade relevante, por violação de um preceito previsto no RJRL [Regime Jurídico do Referendo Local]".
Na fundamentação da decisão, o Tribunal Constitucional apontou a necessidade de identificar os mandatários desta iniciativa popular, "em número não inferior a 15", e de a AML pedir um parecer ao presidente da Câmara de Lisboa, uma vez que é ao executivo municipal que compete determinar o cancelamento do registo do estabelecimento do alojamento local nas condições previstas na lei, nomeadamente o Regime Jurídico da Exploração dos Estabelecimentos de Alojamento Local (RJEEAL).
A AML não solicitou ao presidente da câmara municipal esse parecer, pelo que foi também "inobservada esta formalidade".
Moedas comemora decisão. "Derrota para a esquerda radical"
Em reação, o presidente da Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, considerou no sábado que a decisão do Tribunal Constitucional "é uma grande derrota para a esquerda radical apoiada pelo PS".
Numa declaração escrita enviada à agência Lusa, o social-democrata destacou o trabalho do atual executivo municipal, liderado por PSD/CDS-PP, na regulação do AL na cidade, "com moderação e de forma equilibrada, que protege os lisboetas", e criticou a anterior gestão do PS.
Para o presidente da Câmara de Lisboa, esta é uma derrota para "os mesmos que expulsaram lisboetas da cidade nos últimos 14 anos". O AL, indicou, "passou de 500 unidades em 2011 para 18 mil em 2018".
Autarca socialista defende que PS devia ter assumido referendo
Do lado dos socialistas, o presidente da junta lisboeta de Santa Maria Maior, Miguel Coelho, lamentou que o referendo sobre alojamento local em Lisboa tenha sido invalidado e defendeu que a iniciativa deveria ter sido apresentada pelos socialistas.
O socialista, que termina este ano o último mandato como presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior (o terceiro consecutivo), reforçou a necessidade de se realizar o referendo na cidade, desconhecendo qual poderá ser o desfecho final do processo.
IL pede demissão de presidente da AML
Perante esta decisão do TC, a Iniciativa Liberal (IL) defendeu a demissão da presidente da Assembleia Municipal de Lisboa.
Para os liberais, o chumbo do TC "é uma derrota" para a AML "que cedeu ao populismo" e neste momento a presidente da AML já "não reúne condições para continuar em funções", afirmou Angelique Da Teresa, deputada municipal da Iniciativa Liberal em comunicado.
"Caso não se demita", a IL "pondera apresentar uma moção de censura", acrescenta a deputada municipal, considerando que a decisão do TC "confirma as irregularidades apontadas pela Iniciativa Liberal".
Movimento Referendo pela Habitação vai "deliberar sobre próximos passos"
A Lusa questionou o Movimento Referendo pela Habitação, responsável pela iniciativa popular, que indicou estar a "analisar em profundidade o acórdão e a deliberar sobre os próximos passos", perspetivando mais informação nos próximos dias.
A Assembleia Municipal de Lisboa também foi questionada, mas ainda não respondeu. Em 03 de dezembro, este órgão aprovou a conversão da iniciativa popular para um referendo local sobre alojamento local, com votos a favor de PS, BE, PEV, PAN, Livre e dois deputados não inscritos (Cidadãos por Lisboa, eleitos pela coligação PS/Livre), votos contra de PSD, CDS-PP, IL, PPM, Aliança, Chega e uma deputada não inscrita (que se desfiliou do CDS-PP), e abstenções de PCP e MPT.
Atualmente, por proposta do PS no executivo, estão suspensas novas licenças de alojamento local em todo o território da cidade, onde o rácio entre alojamentos familiares clássicos e alojamentos locais é de 7,2%, ultrapassando o máximo previsto de 5%. Essa suspensão manter-se-á em vigor até à entrada em vigor da alteração ao Regulamento Municipal do Alojamento Local, que está em processo de consulta pública.
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