Algumas crianças na Síria "nunca viram a paz em toda a sua vida"

Na Síria, devastada pela guerra civil e a recompor-se da queda do Presidente Bashar al-Assad, há crianças que "nunca viram a paz" na sua vida e precisam de apoio para voltar à escola e à comunidade, alerta a UNICEF.

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Lusa
25/12/2024 19:51 ‧ ontem por Lusa

Mundo

Síria

"As crianças viveram e testemunharam uma série de episódios de violência e conflitos e precisamos de lhes prestar apoio através de cuidados psicossociais. Algumas crianças também foram mortas ou feridas e temos de lhes dar proteção e cuidados", afirmou Mioh Nemoto, representante adjunto da UNICEF na Síria, em entrevista à Lusa a partir de território sírio.

 

Num país onde mais de 350.000 crianças se encontram deslocadas e onde, mesmo antes da deposição do Presidente sírio a 08 de dezembro, "quase dois milhões de crianças" não frequentavam a escola, adiantou, "a UNICEF, juntamente com outras agências da ONU", tem vindo a "coordenar o apoio às crianças sírias e às suas famílias" em áreas fundamentais como "alimentação, cuidados de saúde, água, saneamento e educação".

"As crianças na Síria já sofreram o suficiente nos últimos 14 anos. Algumas das crianças nunca viram a paz em toda a sua vida. É preciso trazê-las de volta à escola e trazê-las de volta à comunidade", disse Nemoto à Lusa.

Após o colapso do regime de Bashar al-Assad, levado a cabo por uma coligação de rebeldes liderada pela Organização de Libertação do Levante (Hayat Tahrir al-Sham, HTS), o país tem vivido um misto de otimismo e desordem, debatendo-se atualmente com um cenário de segurança instável, uma crise humanitária crescente e deslocações generalizadas.

Nemoto afirmou ainda que, apesar "da maioria das salas de aula terem voltado ao normal" no país a 15 de dezembro, algumas crianças ainda "não têm acesso à aprendizagem e à educação".

"Uma em cada três escolas foi danificada pelo conflito e também pelos terramotos no ano passado e é necessário não só dar resposta às necessidades imediatas, mas também reconstruir estas infraestruturas. E isto tem de ser feito rapidamente", adiantou.

O funcionário da UNICEF sublinhou ainda que as crianças sírias continuam a enfrentar perigo e insegurança no norte do país, onde 44.000 pessoas vivem em centros coletivos de emergência.

Na região curda a norte prosseguem confrontos entre grupos armados apoiados pela Turquia e as forças curdas que controlam parte da região, o que impede o acesso da organização.

"No norte, continuam a registar-se combates e garantir o acesso a essas áreas e apoiar as pessoas no terreno é um desafio para nós. A UNICEF, juntamente com as organizações não-governamentais (ONG) parceiras no terreno e as comunidades, estamos a tentar chegar às crianças mais vulneráveis da Síria", afirmou o representante.

Nemoto referiu que, apesar dos constrangimentos no acesso às zonas do norte do país, a organização "está a tentar explorar todas as vias e modalidades possíveis" para fornecer "água, 'kits' de cuidados de saúde e 'kits' recreativos para as crianças nessas áreas".

As necessidades humanitárias na Síria atingiram o nível mais elevado de sempre, com sete em cada 10 sírios a necessitarem de assistência humanitária e em resposta à pressão significativa a que as infra-estruturas de cuidados de saúde têm sido expostas, os parceiros da UNICEF já enviaram mais de 30 equipas médicas móveis para áreas carenciadas e para campos de deslocados internos, de acordo com um relatório da organização.

Perante a profunda crise humanitária, o representante da UNICEF lamentou a insuficiência dos recursos necessários para prestar a devida assistência à população da Síria.

Sobrecarregado pela situação catastrófica no país, o sistema de saúde pública encontra-se atualmente "à beira do colapso", num contexto onde "metade dos serviços de saúde já estavam desligados" mesmo antes do golpe de Estado.

"Há falta de medicamentos e de pessoal médico e, para podermos prestar serviços médicos imediatos, temos de fornecer material médico de emergência e apoiar os médicos e enfermeiros para que possam continuar a trabalhar nos hospitais".

"O desafio atual é que, para além da logística, a magnitude das necessidades é profunda. Os recursos e o financiamento não são suficientes e não são suficientemente flexíveis para que nos possamos mobilizar rapidamente e apoiar as pessoas necessitadas com serviços sociais básicos", reiterou.

Leia Também: Autoridades sírias declaram recolher obrigatório após manifestações

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